Lygia Clark

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1959 - Já começo a sentir o vazio da forma [diário 2]

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DiaryDocument Type
artMedium
DatilografiaArt Medium
inLanguage
PortuguêsLanguage
date
1959
dateBegin
1959
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transcription

1959

Já começo a sentir o vazio da forma. No balé neo-concreto o instante mais impressionante para mim foi quando a unidade quadrada se deslocou no fundo e foi se fazendo nítida e iluminada. Houve um momento que era o vazio dela mesma, eu vi o recorte dela no espaço.

Foi belo....

Oku me deu um cesto belíssimo. Que forma... quando abri me dei conta de que era a forma também. O lado avesso dela é o outro lado da moeda. A forma só existe em relação absoluta com este vazio. Isto me lembra que talvez na vida real afetiva significa que a aceitação do vazio da feminilidade e a sua importância com relação ao órgão masculino.

Senti que a vida é sempre existente pelas polaridades que se valorizam mutuamente.

Então, o problema vida e arte é um só?

Por ser o homem um vertical, ele usa o espaço horizontal no sentido prático. Quando ele se deita, ele vivencia a verticalidade deste espaço. (Na morte ele se integra horizontalmente na terra.) Tudo que é vivo sai verticalmente dela. E volta para ela no fim do seu tempo. Na verdade o essencial é achar esse tempo enquanto se vive pois seria o retornar à sua origem tendo vivência deste momento criação de um estado ou materialização de uma obra de arte.

Não vejo um plano na vida. É construção do homem.

O homem analisado e a realidade do seu tempo –

Ele destrói também um plano interior (plataforma de equilíbrio) em relação a realidade interior. Quando ele se liberta ele dentro dele mesmo numa multiplicidade de facetas (como o espaço adimensional) e o seu equilíbrio já não é externo mas está inteiramente conjugado interiormente.

Para mim a minha realização fêmea só veio depois de vivenciar o “vazio” pleno que abrangendo o sentido existencial abrangia também no seu sentido imediato a consciência da minha feminilidade.

É sentir o vazio vaginal como.expressivo, interno, em contraposição à sua forma externa = o avesso do pênis que a mulher traz guardado dentro de si.

ID
61675