Lygia Clark

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Minha casa está muito sem sentido para mim. [Diário 1]

documentType
DiaryDocument Type
artMedium
DatilografiaArt Medium
inLanguage
PortuguêsLanguage
date
1971
dateBegin
1971
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author
transcription



Minha casa estava muito sem sentido para mim. Isso já me aconteceu varias vezes quando estou em crise. Naõ estou com motivações bastante para retocar minha serie antiga a galeria de N.Y, naõ fará por ora a exposiçaõ. Minha casa está muito sem sentido para mim. Essa fraze me parece muito significativa. Se A casa é o corpo é o corpo que está sem motivações. Alias é verdade. Sem fazer amor, longe da unica pessoa que impressionou realmente depois de anos na minha vida e sem trabalho manual o que sempre me fez muita falta. E por isso que acho que desta vez é o inconsciente que vae me apontar um novo caminho dando sentido ao corpo. Talvez essa mudança de comceito que introjectei do O corpo ser a casa está sendo vivido ainda sem significado real. Sempre é assim. Depois eu colo o novo conceito. Devo estar colando-o sem saber ainda. Se eu pudesse ao menos escrever o livro teria horas preenchidas por esse trabalho e seria muito bom. O chato é que estou muito cheia de mim mesma. Isso é mau. Terei que ir até o fundo sinaõ naõ sairei desta crise. Agora a tarde estou bastante deprimida. Deprimidissima porque naõ dizer a verdade ?

Medo ? Esconder naõ resolve problema nenhum.

Se a casa é o símbolo do corpo e estou cansada da mesma tambem é de mim mesma que estou enfastiada. Preciso me convencer que sou uma pessoa explendida cheia de conteudo, rica de maturidade e que passo por outra crise como já passei em tantas vezes da minha vida e bem piores que esta! Depois estou vendo todo mundo com problemas como eu. Os outros tem mais distrações de problemas porque estaõ emocionalmente envomvidos ou pela familia ou por projetos. Naõ tenho projetos. Tenho sim a da volta ao Brasil naõ sei quando mas.será quando eu mesma decidir. Acho que estou tendo opçaõ pela primeira vez na minha vida e está sendo dificil. De qualquer maneira resolvo assumir a crise até o fundo para o que der e vier. Estou vencendo pequenas fobias como o de entrar nos cafés e ir ao toilete sozinha, de passar rente as pessoas quando sinto dificuldade, de sair de casa quando estou com problema de somatisacaõ. E andar sempre de metro.

Estou tambem tentando romper rotinas. A da solitaria por exemplo. Interessada em conversar com gente e saber dos seus problemas.....

Como poderia escrever meu livro? Me pergunto todos os dias e vejo a dificuldade. Seria De como saí da loucura para a vida atravez da arte e depois como saí para a vida atravez da arte, deixando de faze-la. Esse é o esquema mas entram todas as vivencias na arte, a percepçaõ das mesmas na vida, os sonhos que formularam muitas vezes o processo da conscientizaçaõ. Sem ilustrar o processo, sem tempo linear. Penso que um dia vae aparecer a forma de expressar isso que seria um documento onde eu procurei colar arte e vida.

De maneira linear seria:- Nascimento de Eduardo, loucura e arte como terapia.

-: Bicho, depois perda da autoria do objeto: grande crise que declanchou a “doença” até a passagem para o objeto sensorial o corpo.

-: Regressaõ nessa fase até atingir outra etapa em que o objeto foi introjectado  o homem se religa com o mundo.

-: Pensamento mudo: a vida no estado drogada.

ID
65624

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